terça-feira, 4 de junho de 2013

Henry Jenkins: as novas mídias e suas implicações para o ensino e a aprendizagem

No vídeo abaixo, de 2009, do Edutopia (fundação educacional do cineasta George Lucas), o pesquisador Henry Jenkins reflete sobre algumas implicações das novas mídias na educação, defendendo que a integração das mesmas ao processo educativo pode se dar de modo a favorecer mudanças de paradigma na educação.

A partir do “Leias mais”, você pode acessar o texto da fala completa de Jenkins.






(Transcrição do texto do vídeo)

Acredito que nossas escolas têm falhado duplamente, por um lado, aquelas crianças que têm um relacionamento rico e envolvente com as mídias fora da escola são desqualificadas e desaparelhadas quando elas entram na sala de aula. A melhor maneira de aprender é tirada dos alunos. Eles são impedidos de acessar aquelas plataformas que lhes permitem compartilhar informações uns com os outros e aprender coisas entre si. Nós estamos impedindo o acesso àqueles arquivos na web que poderiam enriquecer a educação. Nós estivemos envolvidos com um projeto sobre Moby Dick e descobrimos que muitas escolas não permitiam o acesso à informação sobre Moby Dick porque [riso] há a palavra “pau” (dick) nele. Assim, o resultado é que isso é bloqueado por muitas tecnologias de filtragem. Nós descobrimos que as escolas não dão um mínimo acesso ao YouTube, que é absolutamente essencial para o trabalho que nós estávamos fazendo, pois existem muitos materiais ricos nele. Por isso, esse é o problema número um, o problema número dois são aqueles garotos que não têm uma vida rica online, que não têm garagens onde eles possam fazer sua própria tela verde e então manipular câmeras, que de fato não têm acesso à tecnologia, exceto dento das escolas e bibliotecas públicas e se nós restringirmos o acesso lá não a integrando na sua educação, então esses garotos serão duplamente deixados para trás e isso é o que nós podemos chamar de uma brecha de participação, e não apenas quanto ao acesso à tecnologia, é sobre o acesso a experiências de aprendizagem, a habilidades sociais e competências culturais, a um senso de empoderamento e direito que lhes permitem participar integralmente dessa nova sociedade que está emergindo.

Como um médico, o primeiro mandamento é acima de tudo não causar dano. Com essa preocupação os professores afastam a tecnologia, assustam os pais, eles fecham caminhos para as crianças, eles dizem repetidamente às crianças que o que elas aprendem fora da escola não conta na escola e os professores têm que lembrar todo dia que, quando dizem isso, também dizem que o aprendizado na escola não tem relação com todas as outras coisas que os alunos fazem fora dela. Assim, a primeira coisa é parar de magoar, parar a dor, não prejudicar, dar um passo atrás e ter uma perspectiva de mente aberta e estar disposto a explorar e, mesmo se ainda não está pronto para o uso de novas técnicas, reconhecer e valorizar os tipos de aprendizado que ocorrem fora da escola e dar um espaço às crianças para compartilhar essa expertise em sala de aula, de modo que elas se sintam melhor a respeito das coisas que estão fazendo. Agora, um dos problemas é as crianças desvalorizarem o aprendizado que se dá nos games, comunidades de fãs e comunidades online, porque seus professores e pais não valorizam isso, o que leva a uma série de problemas. Algumas das questões de cyber bullying e ética podem estar ligadas ao fato de que eles simplesmente não veem essas experiências como sendo tão reais ou válidas como outras coisas. Então, vamos primeiro validar isso, depois descobrir o que nós podemos aprender a partir disso e finalmente utilizar esse aprendizado e, depois, mudar nossas técnicas de ensino e o nosso conteúdo para refletir a realidade que nossos estudantes estão vivendo. Mas a primeira etapa e não causar dano.

E uma coisa que nós devemos fazer é nos manter afastados de um mundo onde imaginemos nativos e imigrantes digitais, certo? As mais robustas comunidades que eu tenho visto, onde o aprendizado acontece, os adultos e os jovens relacionam-se entre si em novos papéis, com novos relacionamentos baseados em interesses compartilhados. Certamente é excitante ver os professores e os estudantes trocando de papéis na sala, mas as nossas salas de aula continuam a ter relações muito rígidas entre professores e estudantes e os professores com frequência dizem “eu não sei nada sobre tecnologia e eu não posso sair, porque eu perderia o controle da sala” e nós temos tido a sorte de criar um espaço onde as pessoas podem aprender uma da outra entre gerações. Acredito que está ligado a essa ideia, nós temos um mundo onde estamos assumindo que todo mundo está se tornando um aprendiz autônomo, que todos serão capazes de saber de tudo. O que nós sabemos em um mundo de redes sociais de inteligência coletiva é que todos sabem algumas coisas e o que cada membro sabe está disponível para o grupo quanto necessário e que isso requer o desenvolvimento de uma nova ética de produção de conhecimento, avaliação, assumir a responsabilidade por aquilo que você sabe, assegurando a precisão da informação que você comunica aos outros, tentando ser responsável por compartilhar o que você sabe com os outros e sendo honesto com as pessoas que compartilham informação que você sabe ser incorreta e corrigindo-a. Assim, teremos um ambiente colaborativo autocorretivo e que é um modo diferente de pensar sobre como o conhecimento se produz e é compartilhado, diferente do modelo de aprendizado autônomo que molda a maioria de nossas escolas hoje.

Nós estamos certamente dando algumas estratégias e conselhos para os professores, porém você também deseja não fazer isso sozinho, certo? Você quer se conectar com outros professores que estão fazendo as mesmas coisas e por isso creio que é importante construir uma comunidade online para os professores trocarem informações, fornecerem apoio uns aos outros. O maior dos pequenos medos é que você não saberá tudo que irá ocorrer na sala de aula. Não falo no sentido de não ser capaz de observá-la, mas de você não ser o único especialista na sala em certo ponto e isso assusta os professores, pois repentinamente uma conversação começa e você não sabe para onde ela vai e, francamente, não estou certo das nossas escolas estarem completamente prontas para permitir essa livre troca incerta. Exista tanta preocupação e ansiedade sobre dizer coisas erradas, ensinar coisas erradas, agora mesmo, impedindo um monte de professores talentosos de serem capazes de explorar totalmente aquilo em que uma sala de aula e um ambiente colaborativo poderiam convergir. Assim, creio que é dando suporte a você, deixando os administradores saberem o que você está fazendo, deixando os pais saberem o que você está fazendo e então descobrindo que outros tipos de suporte você precisa, quer sejam os especialistas locais que conhecem partes da história que você não conhece sobre quem pode ser acionado, de algum modo, para conectar as pessoas em torno delas permitindo-as fazer isso. Porém, novamente, não é apenas o aprendiz na sala de aula deixando de ser autônomo, mas o professor indo de uma posição autônoma para ser parte de uma rede social e você precisa ter uma rede social ao redor, confiar na capacidade de mover-se integralmente nessa direção.

Nós começamos a tentar identificar as 12 habilidades fundamentais que acreditamos que os jovens precisem adquirir para ser capazes de participar plenamente nessa nova paisagem midiática e essas habilidades variam de jogar e agir a avaliar e negociar, criar redes, inteligência coletiva, apropriação. Essas são habilidades sociais, não são habilidades individuais, elas são capacidades que permitem às pessoas trabalhar juntas e colaborar significativamente umas com as outras e o próximo passo será responder como traduzir isso em materiais curriculares? Como podemos ensinar literatura na aula, de modo diferente? Como Moby Dick pode ser ensinado de modo diferente nas aulas de inglês? Ou a cartografia deve ser ensinada diferentemente na aula de ciência social em um mundo onde podemos combinar essas habilidades com as novas tecnologias. Portanto, isso não é sobre media literacy como um tema adicional de fim de semana se as crianças têm se comportado bem, isso é sobre a criação de uma mudança de paradigma nos modos como ensinamos tudo e, da mesma forma, nós estamos desenvolvendo aspectos que são recursos para os programas pós-escola e aprendizes individuais que desejam aprofundar-se nas especificidades da mídia.

Como vamos decidir qual é o uso apropriado de algum trabalho criativo, visto que nós sabemos que a criatividade sempre envolve remixar materiais do reservatório cultural. A grande obra criativa utiliza histórias já existentes e as reconfigura para uma nova audiência. Porém, como equilibrar o sentido de que a cultura constrói-se a si mesma com o reconhecimento da autoria individual, uma preocupação quanto ao plágio e assim por diante, ainda mais quanto entendemos que estamos vivendo um momento no qual as normas e a lei podem estar indo em direções diferentes. Assim, desenvolvemos algumas ferramentas simples que permitem às crianças mapear, observar as controvérsias sobre a propriedade e a autoria, para então explorar os termos das normas sociais e padrões legais e usar isso como um meio para pensar sobre o que rege suas escolhas.

O que Eric Klopfer tem desenvolvido são os assim chamados jogos de realidade aumentada. Esses jogos são jogados em ambientes físicos e eles têm tanto a vantagem da informação digital quanto da informação física. Assim, por exemplo, Detetives Ambientais é um jogo que se desenrola no campus do MIT e há um vazamento químico no Rio Charles, você precisa descobrir a fonte do vazamento, você deve caminhar no campus do MIT com seu controle manual, obter a localização específica, você sonda uma nascente virtual e vê dados ficcionais, porém o GPS disponível permite a você ver qual é a composição química do óleo. Mas você está, ao mesmo tempo, verificando os padrões de erosão, a distância ao Charles, o declive do terreno; você compara anotações com os outros jogadores. Assim isso não fica só numa caixa. Por isso, o que ele tem desenvolvido é um conjunto de ferramentas que permitem às crianças acompanhar o esse jogo – aos professores desenvolver games específicos para as comunidades locais. Desse modo, um de meus alunos projetou um jogo para Lexington, onde você tentar descobrir quem deu o primeiro tiro da Revolução Americana. Você pode planejá-lo para um bairro local e ir ao entorno dele, entrevistando os cidadãos que viveram lá por um longo período de tempo e descobrir sobre as diferentes casas e o que aconteceu lá e então usar essa tecnologia para construir algo que estimula as crianças a conhecer melhor sua própria vizinhança. Você pode fazer um jogo de planejamento urbano, que envolva um problema que está desafiando sua comunidade. O ponto é que isso é sobre como favorecer a resolução de um problema, com a informação disponível num GPS que pode ser visto como jogo, porém um jogo que requer pessoas para compartilhar conhecimento e informação entre si.

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