terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Computador e educação: "Isso me parece lógico!"

Com certo alarde - sob o título “Computador demais piora nota de alunos” (para assinantes, aqui) - e atraso, a Folha de S.Paulo repercute hoje pesquisa da UNICAMP que aponta para um resultado que parece um tanto óbvio: estudantes que dizem usar mais o computador (“sempre”) para fazer lições escolares tiveram notas menores no SAEB.

A obviedade, na minha interpretação, se dá pelo fato de que a freqüência no uso do computador que os estudantes anotavam deve estar mais relacionada com os usos gerais (comunicação com amigos, jogos, entretenimento etc.) do que com práticas educacionais (isso, aliás, é sugerido pela reportagem). E, tendo se tornado a mídia das mídias, é claro que o computador é um convite ao lúdico, que se toma muitas horas do dia do estudante irá prejudicar seus estudos.

Todo o professor que já deu aulas em laboratório, sobretudo para estudantes com prática de uso no computador, conhece a possibilidade de dispersão que ele (principalmente quando associado à Internet) pode possuir.

Disso decorre que a relação entre computador/educação é necessariamente prejudicial e que ele deve ser abolido da educação? Em absoluto, embora os resultados de pesquisas nacionais e internacionais estejam longe de confirmar um otimismo exagerado (sobretudo dos fabricantes de equipamentos) sobre as possibilidades pedagógicas do computador.

A respeito de debates e dados sobre o uso do computador na educação, vale a pena ler os vários comentários interessantes (de diferentes autores) sobre o tema no blog de Simon Schwartzman. Como estão todos num mês, dou o link da página em que se encontram (aqui).

Revendo essa página, li de novo um breve texto, na época em versão preliminar, de Maresa Sprietsma, do Centre for European Economic Research, sobre o impacto do uso de computadores nos resultados do SAEB, no Brasil. Metodologicamente parece ser mais interessante do que a pesquisa da UNICAMP, do ponto de vista educacional, pois avalia a situação de uso (ou não) dos computadores em escolas. Pesquisando encontrei a provável versão final do trabalho, que se chama Computers as Pedagogical Tools in Brazil: A Pseudo-panel Analysis, ele pode ser lido na íntegra aqui. E coloco o sumário deste trabalho a partir do “leia mais” (os destaques em negrito são meus para destacar os pontos mais importantes).

O que o trabalho de Sprietsma evidencia é que a existência de laboratórios de informática nas escolas afetou negativamente os escores dos alunos no teste do SAEB em leitura e matemática, nesse caso de modo mais acentuado. Ela interpreta isso como efeito de um provável uso do laboratório ao invés de meios pedagógicos mais eficientes. Ao mesmo tempo, mostra que o uso da Internet pelos professores tem um impacto positivo nas avaliações de seus alunos nas disciplinas mencionadas. E nota também que a introdução das TIC nas escolas promove o letramento digital, que é uma habilidade requerida pelo mercado de trabalho.

Ora, isso indiretamente aponta para algo que é dito na reportagem da Folha, por Marcelo Neri, da FGV: “a discussão deve ser feita em ‘como’ se deve usar o computador e não ‘se’ é preciso usá-lo”.

Nesse sentido, o resultado de Sprietsma é congruente com o da pesquisa, de caráter qualitativo, de Bernardo Sorj e Julie Remold (comentada aqui). Nela, geralmente os educadores percebem os ganhos de auto-estima para os alunos trazidos pelo uso dos computadores e o fato de que a maioria das utilizações dele não contribui para a realização dos objetivos educacionais das escolas. Mas isso aponta primordialmente para “limitações de sua [dos educadores] experiência com o conhecimento de abordagens alternativas ao ensino”. Então, uma conclusão que se pode tirar é a necessidade de usar melhor os computador com objetivos educacionais, e para isso a formação dos educadores nessa perspectiva é importante.

Havia um personagem de desenho animado, quando eu era criança, que dizia, a respeito de tudo, algo com o que finalizo esse comentário: “Isso me parece lógico!”.

Postado por Richard Romancini


Computers as Pedagogical Tools in Brazil: A Pseudo-panel Analysis

Maresa Sprietsma

Non technical summary

Computers and software have been gradually introduced as teaching tools in many countries. Thanks to important public and private investment, the number of schools that have access to computers and internet in the classroom has increased exponentially since the beginning of the nineties. The percentage of schools that have an internet connection has e.g. increased from 5% in 1996 to over 95% in the UK and to over 80% on average in European countries in 2001. In Brazil as well, availability and use of computers and internet in schools represents an important investment and has increased rapidly in recent years. The percentage of teachers that use the computer and internet for pedagogical purposes has increased from 12 to 38 and from 3 to 18 percent respectively between 1999 and 2003. The percentage of schools with a computer laboratory increased from 17 to 35% in the same period.

The most obvious purpose of introducing computers into the classroom is clearly the promotion of computer literacy, a much-demanded skill on the labour market. However, ‘computer assisted instruction’ (CAI) or the use of computers as a learning tool for acquiring other cognitive skills, has come more and more under attention as well.

The question we would like to answer empirically is whether the availability and use of computers and internet for schools is effective in improving test scores in maths and reading. We use Deaton’s pseudopanel estimator on original repeated cross-section data to estimate the effect of the availability and use of ICT in schools in Brazil on pupils’ performance. More precisely, we estimate the effect of the availability of a computer laboratory in school and the use of computers and internet as pedagogical resources by the teacher on 8th grade pupils’ test scores. We find that the availability of a computer laboratory affects test scores negatively in both disciplines and particularly in Maths. Possible interpretations are the existence of a trade-off between investing in a computer lab versus other more effective pedagogical means for schools and, for pupils, between sitting in the lab rather than doing other activities.

But we also find that the use of the internet as a pedagogical resource by the teacher has a significant positive impact on pupils’ test scores in both disciplines in Brazil. Therefore, we may conclude that although merely investing in ICT equipment such as computer laboratories does not seem to improve test scores, there seems to be scope for teachers using the internet as a pedagogical resource. Moreover, we should not forget that ICT in schools may also promote computer literacy, a much demanded skill on the labour market.

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