Queria há algum tempo reproduzir a foto acima, inserida no Blog de Tecnologia numa postagem com o título de “Quando geeks protestam”. Achei a piada boa, mas percebi que nem tudo mundo ia entender.
É claro que piada com tradução perde muito da graça, mas – por alguns motivos, inclusive educativos – vale a pena. Em primeiro lugar o “[/war]” é uma falsa marcação. Marcação (ou tag) é uma instrução de linguagens como a de html e de xml, que geralmente aparecem em duplas. Uma de abertura e outra de fechamento, por exemplo, “[html] [/html]”, “[head] [/head]”*. Assim, o significado do cartaz seria algo como “fim da guerra”.
De outro lado, geek é um termo usual para fanáticos por computação (daí o uso das tags). Um geek pode ser definido, também, como um nerd de computador. Geralmente nerd – além de ter um sentido mais amplo, pode-se dizer que existem nerds de histórias em quadrinhos, games, RPGs etc. – tem um tom depreciativo maior do que geek. E, de fato, ser geek hoje em dia pode ser uma maneira de estar na moda (ver a reportagem do Zero Hora, aqui).
No Brasil, a valoração de alguém como “nerd” ou “geek” parece ser menos marcada que nos Estados Unidos, onde estes termos surgiram. Não há aqui, aliás, nenhum bom termo que traduza essas idéias. Por conseguinte, o estereótipo é menor. Já nos EUA, em particular, há todo um folclore da cultura de massa sobre os nerds – sua inaptidão social, ingenuidade a respeito de assuntos amorosos ou sexuais, vestimenta e comportamento fora dos padrões etc.
O que há de interessante a pensar na relação entre nerds/geeks-tecnologias e escola é que, em muito, o “padrão nerd” é a típica profecia que se auto-realiza, com base em estereótipos. A reflexão clássica sobre esse tema é a do sociólogo Robert Merton (vide o ensaio A profecia que se cumpre por si mesma, em Sociologia: teoria e estrutura, SP. Mestre Jou, 1970, pp. 515-532).
Nesse texto, Merton discute o teorema de W. I. Thomas – “Se os indivíduos definem as situações como reais, elas são reais em suas conseqüências” – de maneira brilhante. Um exemplo utilizado por ele é o “crash” de bancos em 1932 nos EUA, outro – mais útil para essa discussão – é sobre o racismo. Neste caso, Merton mostra como intra e extragrupos sociais os valores se modificam (“eu sou estudioso”, “você é esforçado”, “ele é cdf”) e as crenças sociais se tornam realidades.
O que interessa aqui é que o domínio da tecnologia tende a gerar grupos “dentro/com” (mais facilidade, capacidade, domínio, acesso etc.) e “fora/sem”. De maneira análoga aos grupos sociais, então, esse é um âmbito bastante propício à disseminação dos estereótipos.
Nesse sentido – e no que implica em estigma, preconceito e violência simbólica contra determinados indivíduos – todo educador deve se preocupar com essa questão. Se numa classe de crianças que estão aprendendo a utilizar o computador existe o “clima” de que as meninas são incapazes, provavelmente elas serão incapazes. O rapazinho gordo e míope será tímido e retraído antes por uma expectativa social do que pela própria natureza.
Como sempre, o que se pode recomendar é um papel ativo do educador contra os preconceitos e estereótipos; o desenvolvimento de uma cultura de respeito às diferenças (não baseadas em expectativas sociais) entre as pessoas/alunos. De outro lado, a própria efetividade de uma educação inclusiva a respeito das tecnologias – e não mistificadora destas – pode eliminar a hostilidade contra aqueles que tenham maior ou menor facilidade ou interesse inicial por elas.
* O sinal certo é “<” e “>”, mas coloquei “[ ]”, pois se não o Blogger lê a marcação, que não fica visível.
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